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Foto do escritorÉrica Cezar

Traição: um cenário, três personagens.

Atualizado: 15 de jul. de 2018



Não, esse não é um artigo no qual você verá estatísticas, índices, tabelas, nem nada parecido... É um texto, desses que eu escrevo com o coração, usando todo o meu conhecimento teórico, minha experiência com os atendimentos e baseada na observação da realidade. Nesse caso, uma dura realidade.


Se você espera encontrar culpados, acredito que irá se decepcionar se continuar lendo. A vida de uma pessoa vai muito além do que aquilo que ela escolhe mostrar ao mundo e, depois de atender pessoas traídas, pessoas que traem e amantes, eu só posso dizer uma coisa: todos estão em sofrimento, consciente ou inconscientemente! Por isso, eu não consigo falar disso sob uma única perspectiva! Não importa de que lado você esteja, saiba que existem outros dois lados e que é bom que você entenda o que se passa do lado de lá pra conseguir mudar a sua realidade!



UM CENÁRIO, TRÊS PERSONAGENS:


Sim, existem pessoas de mau caráter! Sim, existem pessoas que querem acabar com a felicidade alheia! Sim, tem pessoas que são egoístas e só pensam no que é melhor pra elas. Sim, existem pessoas que fazem TUDO pelo outro e ainda assim são traídas! Esses são os conteúdos manifestos, conscientes... Aqueles que todos revelam ao mundo.


QUEM ESSAS PESSOAS REALMENTE SÃO


O que você não sabe e eu VEJO na minha frente de tempos em tempos, são pessoas:


Extremamente carentes, dependentes, vazias de afeto, com uma autoestima muito baixa, um amor-próprio largado às traças, o desejo de encontrar ou manter alguém que as salve da sua infelicidade cotidiana, um orgulho imenso que as impedem de lidar com tudo isso, e com um medo que as apavora: o medo da solidão. Por se sentirem assim, essas pessoas aceitam qualquer migalha de afeto, aceitam estar num relacionamento doente e doentio, aceitam a indiferença, aceitam ser a terceira parte de um relacionamento, e aceitam serem colocadas no papel de "vilão". Por serem assim, elas ignoram sinais evidentes de insatisfação, se recusam a encarar a realidade e tentam se defender de todas as formas possíveis.


E aí eu te pergunto: De quem é que eu estou falando? Da pessoa que se sujeita a ser amante? Da pessoa que trai? Hum? Eu estou falando dos três: a pessoa que foi traída, aquele que trai e quem se coloca no papel de amante. Lá no fundo, TODOS tem essas mesmas características, apenas escolheram diferentes formas de agir diante disso.


Como meu público é 87% feminino e a maioria é heterossexual, vou focar no exemplo da mulher que foi traída pelo marido/namorado com outra mulher, ok? Mas a análise é a mesma pra todos os tipos de traição. Vamos lá!


A PESSOA QUE FOI TRAÍDA


De um lado está uma mulher, com todas as características destacadas acima, mas que escolheu lidar com tudo isso assumindo o papel de "EMPENHADA". É o tipo de pessoa que faz TUDO no relacionamento, que se dedica muito à família, aos filhos, ao trabalho, aos estudos ou qualquer coisa que decida fazer. Ela é a esposa ideal (do ponto de vista dela, é claro) e se esforça pra fazer tudo o que precisa pra que tudo corra bem em casa e no relacionamento.


As frases mais pensadas ou pronunciadas são: "Eu faço tudo pra você", "Eu larguei tudo por você", "Eu nunca te magoei ou decepcionei", "Tudo que eu faço é pro bem do nosso relacionamento e da nossa família"... Ela pode ser um amor de pessoa ou a pessoa mais grossa do mundo, não importa, o fato é que ela escolheu se dedicar ao relacionamento o máximo possível pra não correr o risco de perder o companheiro e sempre usará esses "empenhos" pra fazer com que o companheiro se compadeça e permaneça no relacionamento.


A PESSOA QUE TRAIU


Do outro lado, está o companheiro, repito: com todas aquelas características, mas que escolheu lidar com todas as suas fragilidades e medos assumindo o papel do: "EU MEREÇO MAIS". Ele se acha perfeito, se sente incompreendido, desvalorizado e injustiçado, e costuma dar DOIS tipos de justificativas pra sua traição:


1 - a companheira tem muitos defeitos... É muito insensível, muito grossa, fria e materialista. Por que não se separa? Ele diz que, apesar de tudo, ela fez muito por ele! E também tem os filhos (sempre tem os filhos)...


2 - a companheira é uma ÓTIMA pessoa, faz tudo por ele! Mas é sem graça, muito "água com açúcar", previsível e, o mais importante: deixou de ser atraente... A vida sexual deles é quase nula, ele afirma! Por que não se separa? "Não posso! Ela depende muito de mim, eu sou tudo o que ela tem, ela não suportaria um término! Não posso deixar ela com uma mão na frente e outra atrás, coitada!".


A AMANTE


Enquanto isso, lá do lado de lá, COM AS MESMAS CARACTERÍSTICAS, está a amante! Se sentindo linda, bem resolvida, com roupas novas e que valorizam o corpo, lingerie de renda e não de algodão... Ela assumiu o papel de "PODEROSA". Assumir suas fragilidades? Nunca! Ela nem tem fragilidades. É o que ela pensa. Ela se garante tanto quanto aquele que trai (conscientemente, é claro) e se solidariza com o sofrimento que o cara relata...


"Ele é tão infeliz no relacionamento dele! Se conhecer alguém diferente, talvez encontre forças pra terminar de vez aquilo que nunca irá pra frente. Eu preciso ajudar! A mulher dele? Ahhh, pelo que ele contou, ela merece! É tão ruim pra ele ou tão apática. Ele já deu chances pra ela mudar. Ele precisa ser feliz e eu vou ajudar ele com isso, já que eu sou uma pessoa feliz, alegre, animada... É disso que ele precisa ".


SALVE-SE QUEM PUDER!


Esse é o cenário! Egoísta? TODOS SÃO! Você vê alguém pensando na felicidade alheia aqui? Nem eu! Então, sim, o egoísmo impera por todos os lados! Cada um pensando nas suas necessidades!


O cara, precisa de outras mulheres (sim, no plural) pra confirmar o que ele não consegue sentir sozinho: que é bonito, interessante, desejado, amado, querido... Precisa que alguém afirme o tempo que ele é ÓTIMO, enquanto se nega a assumir que é imaturo, inseguro e insaciável. A mulher traída, faz tudo pelo relacionamento e pela família, o que parece altruísmo, mas não é, já que tudo o que ela faz, faz na tentativa desesperada de proteger a si mesma do abandono e da solidão. A amante liga o "dane-se" e, sob o disfarce de tentar salvar o cara de um relacionamento ruim, está tentando, a todo custo, dar um sentido pra própria vida. É um salve-se quem puder!


A VERDADE POR TRÁS DOS DISFARCES


A verdade é que, quando eles se sentam na frente de um Psicólogo ou deitam suas cabeças no travesseiro depois de mais uma semana em que nada mudou, lágrimas rolam por todos os lados! Máscaras caem e o sentimento verdadeiro vem à tona!


A PESSOA QUE TRAIU


O cara que trai, geralmente, tem ou teve um pai rígido, indiferente ou ausente e uma mãe que vivia atrás do pai ou de outros homens. Ele tenta encontrar nos relacionamentos aquilo que não recebeu quando pequeno: amor, carinho, atenção, reconhecimento. Alguém que olhe pra ele e diga que ele é uma boa pessoa. Por mais que ele encontre, ele nunca irá acreditar e seguirá buscando confirmações. Na terapia, ele chora por se sentir tão desamparado... E realmente foi!


Dos três, ele é o mais imaturo. Teve que esconder sua "criança interna" e se fazer de AUTOSSUFICIENTE pra sobreviver nesse mundo onde quem tem mais, é mais feliz (mais dinheiro, mais mulheres, mais bens materiais). Ele acreditou nisso e vai buscar todos os MAIS que ele puder pra encobrir os MENOS (internos) que ele evita encarar.


Se permanece no relacionamento sem antes ter olhado para seus aspectos inconscientes, continua fazendo de tudo para sabotar qualquer possibilidade de sucesso. Além disso, continua focando nos pontos negativos da relação pra justificar mais uma traição. Se ele se separa pra ficar com a amante, ou irá atribuir a ela o DEVER de suprir todas as suas necessidades, sob a justificativa de que ele largou tudo pra ficar com ela, ou irá agir da mesma maneira que agiu no relacionamento anterior. De uma forma ou de outra, nunca se sentirá satisfeito!


A AMANTE


A pessoa que aceita assumir esse papel, geralmente, teve pouco contato com o pai ou teve uma mãe ou irmã que se colocava entre ela e o pai e não permitia que eles se relacionassem sozinhos, pai e filha. Adulta, ao invés de servir e se empenhar ao Outro, como a pessoa traída faz, ela escolhe servir a si mesma, acreditando que isso é autoestima e amor-próprio. Usa sua aparência física pra conquistar um homem que ela possa chamar de seu e mostrar para o mundo... Coisa que ela não conseguiu fazer na sua infância porque foi impedida pelas outras mulheres da casa ou pela ausência do pai.


Ela precisa ter "O CARA" do seu lado, afinal, ela vê isso como uma competição. Ela quer o melhor! Pra combinar com as suas roupas, sapatos, jóias e etc... O que ela descobre com a ajuda necessária é que todas essas características positivas que ela acredita ter, fazem parte de um mecanismo de defesa que encobre suas fragilidades (aquelas lá de cima). No final das contas, quem mais precisa ser salva dos três, é ela.


Na terapia, ela chora por mais uma perda na vida... Chora por, novamente, ver uma mulher se colocar entre ela e a tão sonhada felicidade a dois, ou por ver mais um homem indo embora da sua vida sem poder conviver com ele intimamente. E mesmo quando o cara a escolhe, ela chora! Dessa vez porque ela não sabe por quanto tempo conseguirá manter essa "máscara" que fez com que ele se sentisse atraído; porque ele não está tão inteiro no relacionamento quanto ela queria; porque ela acha que ele ainda pensa na ex; ou porque ela teme que ele faça o mesmo com ela. Agora, quem fará de tudo pra não ser abandonada será ela.


A PESSOA QUE FOI TRAÍDA


Por fim, temos a mulher que foi traída. Aquela que, geralmente, teve pais muito exigentes na sua infância e que nunca se sentiu boa o suficiente pra eles. Como não conseguiu agradar os pais (assim ela pensa), ela segue querendo agradar o mundo e se emprenha pra isso. Tudo, com a intenção de ser amada e de nunca ser abandonada. Ela decidiu viver para servir! Decidiu que o companheiro seria o seu foco maior e colocou sobre ele a função de oferecer a ela tudo aquilo que seus pais não conseguiram: estabilidade, segurança e, principalmente, amor incondicional.


Se o marido permanece com ela depois da traição, ela nunca vai pensar que foi escolhida. Sempre pensará que ele ficou porque foi convencido (por ela ou por parentes) ou porque teve pena dela. Ela irá perguntar infinitamente o que ele viu na outra, como ela era, como ele era quando estava com ela, o que fizeram, como foi... Ela não tem a menor condição de lidar com isso sozinha e jamais irá superar se não tiver ajuda!


E, se o companheiro terminou o relacionamento pra ficar com a amante, seu maior medo se concretizou: ela foi abandonada! E ela chora por, novamente, não ter sido boa o suficiente, apesar dos seus esforços. Além dos pais, ela também não conseguiu agradar o companheiro o suficiente pra que ele ficasse. E essa é maior dor, não a traição!


O diferencial é que ela sim tem a permissão social pra sofrer, os outros dois não! Então ela sofre com toda a dor que pode porque no seu caso, não houve escolha, ela foi uma vítima! É o que ela pensa e diz pra si mesma o tempo todo, mesmo sabendo que ignorou uma séries de sinais de que as coisas não iam bem, mesmo tendo insistido pro companheiro ficar por inúmeras vezes, e mesmo tendo permanecido num relacionamento onde nunca foi tratada como gostaria.


O CULPADO?


Como é possível observar, todos tem as suas justificativas, todos tem uma história, e todos mentem conscientemente pra preservar sua realidade inconsciente! Lá no fundo, todos estão em profundo sofrimento. O sentimento de DESAMPARO, aliado a todas aquelas outras características, dá origem a comportamentos desesperados: trair, aceitar ser a Outra, ou se anular e se humilhar pra manter um relacionamento que já estava fadado ao caos muito antes da traição.


O que eles não sabem é que seus caminhos se cruzaram porque suas fragilidades são as mesmas. A tríade perfeita se formou e o resultado foi esse. Se cada um tivesse trabalhado suas fraquezas, nada disso teria acontecido. O relacionamento teria terminado assim que a mulher percebesse o distanciamento do companheiro. O companheiro terminaria assim que percebesse a agressividade da mulher ou a sua apatia. A amante não aceitaria ser a segunda opção de ninguém.


Tudo aconteceu porque todos os envolvidos escolheram varrer sua "sujeira" (interna) pra debaixo do tapete, criar defesas para encobrir suas fragilidades, e colocar sobre o Outro a responsabilidade de os fazer felizes.


Essa é a verdade que eu enxergo tendo tido o privilégio de me sentar de frente com cada um deles inúmeras vezes. Quem é o culpado? Acredito que nem você consiga apontar depois de ler isso! Todos são vítimas! Vítimas de si mesmos e de suas histórias de vida. Todos estão lutando desesperadamente pra serem felizes e USANDO pessoas pra que isso aconteça. Enquanto olharem pro lado de fora e buscarem no mundo externo aquilo que lhes falta, eles nunca serão verdadeiramente felizes. E ainda que as fotos nas redes sociais te façam pensar o contrário, apenas o divã de um Psicólogo e o travesseiro de cada um deles sabe o que e fato se passa dentro daquelas cabeças e daqueles corações.


Não há culpados, vítimas e, muito menos, ganhadores.

Esse é o tipo de história em que TODOS PERDEM!


COMO MUDAR ESSE CENÁRIO?


Se você viveu, está vivendo, ou tem medo de viver uma traição, saiba que apenas o autoconhecimento, o mergulho profundo em suas próprias dores e o reconhecimento das suas vulnerabilidades poderá te levar pra um caminho diferente desse. Quando o Outro deixar de ser o foco e toda sua atenção se voltar para o seu mundo interno, aí sim o cenário pode mudar!


Abandone esse papel que você assumiu, deixe de lado o julgamento dos envolvidos nessa história, e "seja - você - a mudança que quer ver no mundo" (Gandhi).

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